Por: Natalia Lima Amaral
No período da pandemia surgiu uma iniciativa, por parte da Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos (OMDDH), de compilar trabalhos acadêmicos desenvolvidos com o intuito de abrir caminho para novas reflexões envolvendo temas como saúde pública e direitos fundamentais. Por meio de um edital divulgado, 13 alunos e professores da Univale puderam submeter seus trabalhos e participar do e-book "Coletânea Internacional sobre Direitos Humanos Volume 1”.
Ângela Vitória Andrade Gonçalves da Silva é aluna do Mestrado em Gestão Integrada do Território e escreveu o artigo “Admirável mundo não tão novo: o fim do ócio, da preguiça e da literatura” em parceria com o seu orientador Bernardo Gomes Barbosa Nogueira. Para o professor, o tema é imprescindível nos dias contemporâneos, visto que é perceptível uma “intromissão do mundo e do tempo do trabalho na vida privada das pessoas”, principalmente com a pandemia.
“As relações se misturaram e dentro de um espectro neoliberal, as pessoas vêm perdendo a relação com o ócio e com a literatura, que são expressões que nos tornam de algum modo mais empáticos. Em um tempo cooptado pelo trabalho o humano se perde em funcionalismos, e os efeitos são desde relações menos aprofundadas, menos amorosas, seja consigo, seja com o outro. Falar de um tempo em que não estejamos em modo de produção é colocar atenção a uma dimensão fundamental na forma como nos relacionamos em comunidade. E assim acentuar os afetos e problematizar a maneira como eles estão a ser esquecidos, como estão a ser descuidados”, explica o professor.
O livro aborda a questão de bebês geneticamente modificados e que têm suas preferências baseadas em suas castas. E nessa realidade só é incentivado aquilo que é passível de trazer acumulação de lucro e geração de mais-valia. “Por exemplo, os bebês que eram destinados a uma classe mais baixa, e que iriam desempenhar trabalhos braçais, não eram incentivados a ler e nem mesmo gostar de flores. A leitura, por ser uma potenciadora de desencadear uma possível crítica ao sistema, além de fazer com que os bebês perdessem um tempo ao qual poderiam estar produzindo, e as flores por não gerarem lucro algum”, explica Ângela.
Na pesquisa foi possível traçar um paralelo entre o admirável mundo novo de Huxley com a sociedade atual, que, de acordo com a mestranda, não se mostra tão nova e distante dos objetivos de produção.
Segundo a pesquisadora, temos hoje uma sociedade que está caminhando para um mundo de trabalho ininterrupto, sendo inaceitável que o tempo seja de deleite ao ócio, ao descanso, à preguiça e à literatura. “Vemos que os direitos fundamentais que decorrem do ócio não estão sendo observados. Pelo contrário, estão sendo furtados de maneira gritante na sociedade, principalmente da classe trabalhadora que hoje é identificada por meio de um mito do empreendedorismo. Acredito que as decorrências do neoliberalismo como um todo estão presentes na nossa vida em sociedade e furtar desse estudo é furtar do conhecimento sobre o que está acontecendo no hoje e agora”.
Ângela também acredita que a pesquisa é fundamental para que se desenvolva uma perspectiva de autocrítica do que é vivenciado na sociedade atual e do processo de racionalidade que afeta a vida de todos, condicionando-os somente a um segmento social. Além disso, o estudo proporciona uma reflexão sobre o modo de produção ininterrupta e predatória, de forma que desperte as pessoas a parar e resistir a essas condições quando necessário.
Para o professor Bernardo, a experiência de contribuir no artigo com sua orientanda foi uma oportunidade para novas reflexões. “Trabalhar com nossos orientandos nos conduz a uma abertura de horizontes mútuos e ao mesmo tempo abre possibilidades de atuação conjunta na construção de saberes, de troca de experiências e verticalização das pesquisas. Não há docência que não esteja aliada à inclusão e transformação, seja das relações sociais, seja de nós mesmos.”
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