No Brasil, a Educação Infantil é obrigatória a partir dos quatro anos de idade. Entretanto, pesquisas apontam que, mesmo antes dessa faixa-etária, a escolarização pode afetar significativamente o desenvolvimento das crianças. Com base na coleta de dados em cinco cidades brasileiras, o estudo científico "Desenvolvimento de crianças pré-escolares em instituições de educação infantil: indicadores de atrasos e de fatores de risco e proteção" busca compreender essas influências.
Uma pesquisa publicada em 2013 apontou uma relação direta entre as vivências experimentadas por crianças durante seus primeiros anos de vida, e o desenvolvimento de dificuldades na fase adulta, como problemas físicos, comportamento antissocial e criminoso, e abuso de entorpecentes. O autor da pesquisa, Edward Melhuish, afirmou ainda que a correlação entre a frequência à Educação Infantil e o desenvolvimento infantil não estaria apenas ligada à inserção no sistema educacional, mas também a qualidade desta experiência.
Dados apresentados no relatório do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP (2013) mostram que a frequência à Educação Infantil no Brasil ainda está abaixo do índice desejável, ou seja, muitas crianças, de zero a três anos, que moram no país, estão fora da escola. Em números, a pesquisa mostra que até 2011, aproximadamente 21% das crianças dessa faixa etária estavam matriculadas na Educação Infantil, em contraposição ao grupo de crianças de quatro e cinco anos, cuja porcentagem era de 82%. Embora tenha havido aumento de 45% nas matrículas em creches, no período de 2007 a 2011, ainda é preocupante o número de crianças fora das creches, principalmente em um país cuja população é majoritariamente de baixa renda.
Para compreender as influências que surgem a partir da experiência na escola e no círculo familiar de uma criança, um grupo de pesquisadoras, de cinco localidades, criou o projeto "Desenvolvimento de crianças pré-escolares em instituições de educação infantil: indicadores de atrasos e de fatores de risco e proteção". O estudo será realizado em escolas públicas e privadas de Brasília (DF), Governador Valadares (MG), Juiz de Fora (MG), Novo Horizonte (SP) e Ribeirão Bonito (SP), com o objetivo de propor estratégias de prevenção no âmbito da criança, da família e das creches.
De acordo com a pesquisadora Bruna Rocha de Almeida, professora doutora da Univale, que representa a pesquisa em Governador Valadares, o projeto vai investigar as características das famílias e das Instituições de Educação Infantil (IEI), para assim encontrar quais são aquelas que estão associadas aos riscos e à proteção do desenvolvimento da criança.
“Sabemos que o desenvolvimento da criança sofre influências dos contextos que ela participa. Nas sociedades ocidentais, a família e IEI são os principais contextos de desenvolvimento na infância e podem promover ou inibir o desenvolvimento saudável da criança, a depender dos recursos humanos e materiais disponíveis e utilizados”, explica Bruna Almeida.
A pesquisa vai realizar a aplicação da versão traduzida para o português brasileiro do Sistema de Detecção Precoce de Atraso no Desenvolvimento (SDPTD), que é um instrumento espanhol baseado em comportamentos, com a intenção de adaptá-lo e validá-lo para o contexto nacional. O SDPTD visa identificar um padrão de desenvolvimento a partir da relação entre idade, hábitos e ações e a partir disso, identificar e caracterizar crianças com dificuldades/atrasos no desenvolvimento motor, de linguagem, comunicação e socioemocional, além de reconhecer fatores de risco e proteção, seja na família ou na creche, associados aos prováveis atrasos ou dificuldades identificados.
Além do SDPTD serão aplicados também três questionários: o questionário sobre recursos disponíveis à criança, o questionário de caracterização do sistema familiar e o questionário de caracterização da escola de educação infantil. Sendo que o primeiro deles foi elaborado exclusivamente para esta pesquisa e os outros dois já são utilizados em pesquisas brasileiras.
Até o momento já foram coletados dados em 20 instituições de educação infantil, relativos a 698 crianças com idade entre 3 e 47 meses. Sendo que em Governador Valadares, foram coletados dados em sete instituições privadas de educação infantil, referentes a 240 crianças, e em 60 famílias. Nas demais localidades os dados foram coletados em instituições públicas e a análise dos resultados da pesquisa levará em consideração essa variável.
Ainda segundo Bruna Almeida a pesquisa é classificada como exploratória, podendo gerar dados tanto qualitativos como quantitativos, apresentando portanto resultados em números e percentuais e também resultados explicativos que abordam as subjetividades dos processos. “É preciso envidar esforços não somente para aumentar o número de vagas e de crianças matriculadas em creches, mas também para que o ambiente familiar e as creches/IEI promovam a implementação de inúmeras atividades que envolvam a criança, a fim de reduzir os riscos para o desenvolvimento em etapas subsequentes do curso de vida”, afirma a pesquisadora.
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